permanecera estavel por milenios. A prefeita Waldron foi a primeira a se recuperar do choque.

— Bem, isto certamente nos poupa um bocado de trabalho — disse ela num certo tom de desculpa.

— Mas de onde vem voces? Eu temo que tenhamos perdido o contato com nossos vizinhos desde que nossa antena de espaco profundo foi destruida.

O homem mais velho olhou para seu colega mais alto e alguma mensagem silenciosa passou entre eles. Entao eles se voltaram para a prefeita que aguardava. Nao havia engano na tristeza transmitida por aquela linda voz, enquanto fazia sua afirmativa absurda.

— Pode ser dificil para voces acreditarem nisso — disse ele —, mas nos nao somos de nenhuma das colonias. Viemos diretamente da Terra.

II — MAGALHAES

6. QUEDA PLANETARIA

Mesmo antes de abrir os olhos Loren ja sabia exatamente onde se encontrava, achando isto bem surpreendente. Depois de dormir duzentos anos, alguma confusao mental seria compreensivel, mas parecia ter sido ontem que tinha feito sua ultima anotacao no diario da nave. E ate onde podia se lembrar, nao tivera um unico sonho. Estava grato por isso.

Ainda mantendo os olhos fechados, ele se concentrou em todos os seus outros canais sensoriais, um de cada vez. Podia ouvir um suave murmurio de vozes, suavemente tranquilizadoras. La estava o sussurro familiar dos renovadores de ar e ele podia sentir uma brisa quase imperceptivel lancando agradaveis cheiros de anti- septicos em seu rosto. A unica sensacao que nao sentia era seu peso. Ergueu o braco direito, sem esforco: ele permaneceu flutuando no meio do ar, aguardando a proxima ordem.

— Alo, Sr. Lorenson — disse uma voz agradavel e atrevida.

— Entao decidiu se juntar a nos novamente. Como se sente? Loren finalmente abriu os olhos tentando focaliza-los na figura indistinta flutuando ao lado da cama.

— Alo, doutora. Estou otimo. E com fome.

— Isto e sempre um bom sinal. Pode se vestir mas nao se mova muito rapidamente por uns tempos. E pode decidir depois se quer manter essa barba. Loren dirigiu a mao que ainda flutuava em direcao ao queixo e ficou admirado com a quantidade de pelos encontrados ali. Como a maioria dos homens ele nunca optara pela erradicacao permanente (volumes inteiros de psicologia tinham sido escritos sobre esse assunto). Talvez fosse hora de pensar seriamente em fazer isso, era divertido como tais trivialidades ocupavam sua mente, mesmo numa ocasiao como aquela.

— Chegamos em seguranca? — E claro, de outro modo voce ainda estaria dormindo. Tudo transcorreu de acordo com o plano. A nave principiou a nos despertar ha um mes — agora estamos em orbita acima de Thalassa. As equipes de manutencao ja checaram todos os sistemas, agora e a sua vez de realizar algum trabalho. E temos uma pequena surpresa para voce.

— Agradavel, eu espero.

— Nos tambem. O comandante Bey fara uma exposicao daqui a duas horas na Reuniao Geral. Se nao quiser se mover ainda, pode olhar daqui.

— Eu irei para a Sala de Reuniao. Gostaria de rever todo mundo. Mas posso tomar o meu desjejum primeiro? Faz um bom tempo. O comandante Sirdar Bey parecia cansado mas feliz, ao dar as boas-vindas para os quinze homens e mulheres que tinham acabado de ser reanimados e os apresentar aos outros trinta, que formavam as atuais tripulacoes A e B. De acordo com os regulamentos da nave, a tripulacao C devia estar dormindo, mas varios deles se esgueiravam no fundo da Sala de Reuniao, fingindo nao estar la.

— Fico feliz que tenham se unido a nos — disse ele aos recemchegados.

— E bom ver alguns rostos novos por aqui. E e melhor ainda ver um planeta e saber que nossa nave realizou os primeiros duzentos anos de seu plano de missao sem nenhuma anomalia seria. Aqui esta Thalassa, bem dentro do cronograma. Todos se voltaram na direcao do sistema visual que cobria a maior

parte de uma das paredes. Boa parte dele estava reservada aos dados e as informacoes quanto a condicao da nave, mas a secao maior podia ter sido uma janela aberta para o espaco. Estava completamente tomada por uma imagem surpreendentemente bela de um globo azul e branco, quase inteiramente iluminado. Provavelmente todos na sala tinham reparado em sua tocante semelhanca com a Terra, tal como vista de um ponto bem acima do Pacifico. Quase todo agua, com apenas algumas massas de terra isoladas. E havia terra aqui, formando um grupo compacto de tres ilhas, parcialmente ocultas por um veu de nuvens. Loren pensou no Havai, que ele nunca tinha visto e que nao mais existia. Mas havia uma diferenca fundamental entre os dois planetas. O hemisferio oposto da Terra era quase todo tomado por continentes. O hemisferio oposto de Thalassa era inteiramente oceano.

— Ai esta — disse o comandante orgulhoso.

— Exatamente como os planejadores da missao previram. Mas existe um detalhe que eles nao esperavam e que certamente afetara nossas operacoes.

— Voces se recordam que Thalassa foi semeada por um modulo Mark 3A, de cinquenta mil unidades, que deixou a Terra em 2751 e chegou em 3109. Tudo correu bem e as primeiras transmissoes foram recebidas cento e sessenta anos depois. Elas continuaram intermitentemente por quase dois seculos e entao pararam subitamente, depois de uma breve mensagem relatando uma grande erupcao vulcanica. Nada mais se ouviu e foi presumido que nossa colonia em Thalassa tinha sido destruida ou pelo menos reduzida ao barbarismo, como parece ter acontecido em varios outros casos.

— Em prol dos recem-chegados, permitam-me repetir o que descobrimos. Naturalmente, escutamos todas as frequencias quando penetramos neste sistema. Nada, nem mesmo um escape de radiacao proveniente de energia.

— Quando chegamos mais perto, percebemos que isto nao provava nada. Thalassa tinha uma ionosfera muito densa. Podia haver um bocado de trafego de radio em ondas curtas e medias acontecendo debaixo dela e ninguem acima jamais saberia. Microondas poderiam atravessar, e claro, mas talvez eles nao precisem delas, ou nos nao tivemos a sorte de interceptar um feixe.

— De qualquer modo, existe uma civilizacao bem desenvolvida la embaixo. Nos vimos as luzes de suas cidades e vilarejos, assim que tivemos uma boa visao pelo lado noturno. Ha um bocado de pequenas industrias, e uma pequena navegacao de cabotagem, nada de navios grandes, e nos ate mesmo localizamos um par de avioes movendo-se com uma velocidade de uns quinhentos cliques, o que os leva a qualquer parte do lugar em quinze minutos.

— Obviamente eles nao necessitam muito de transporte aereo numa comunidade tao compacta, possuindo um bom sistema de estradas. Mas ainda nao fomos capazes de detectar nenhuma comunicacao. E nao ha satelites tambem, nem mesmo meteorologicos, de que voces poderiam pensar que eles necessitassem… embora talvez nao precisem, ja que seus barcos nunca se afastam demasiadamente da costa. Nao existem outras terras para ir, e claro.

— Assim, aqui estamos. E uma situacao interessante e uma surpresa muito agradavel. Pelo menos espero que seja. Agora, alguma pergunta? Sim, Sr. Lorenson? — Ja tentaram contacta-los, senhor? — Ainda nao, achamos que nao seria recomendavel ate sabermos qual o nivel exato de sua cultura. O que quer que facamos poderia ser um choque consideravel para eles.

— Eles sabem que estamos aqui? — Provavelmente nao.

— Mas certamente nossa propulsao… eles devem ter visto aquilo! Era uma pergunta razoavel, ja que um ramjato quantico funcionando a plena forca constituia um dos espetaculos mais dramaticos ja realizados pelo homem. Era tao brilhante quanto uma bomba atomica e durava muito mais, meses em vez de milissegundos.

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