– Posso estar ai ao meio-dia. Onde nos encontramos?

Dei-lhe o nome de um restaurante em East Hampton e expliquei-lhe como chegar ate la.

– Otimo – disse ele. Desliguei e suspirei alto. Subi para me vestir.

Evelyn estava saindo da cama e dei-lhe um beijo de bom-dia. Pela primeira vez, ela nao estava mal-humorada a essa hora.

– Voce cheira a sal – murmurou ela. – Hum, delicioso! – Dei-lhe uma palmada carinhosa no bumbum e disse-lhe que ia estar ocupado a hora do almoco, mas que lhe telefonaria mais tarde, para lhe dizer como iam as coisas.

No carro, a caminho de East Hampton, resolvi que poderia dar a Hank dez mil dolares. No maximo, dez mil. Gostaria que ele tivesse escolhido outro dia para me telefonar.

Fabian andava de um lado para outro da galeria, endireitando os quadros, embora todos eles me parecessem perfeitamente direitos. A estudante que tinhamos contratado para nos ajudar durante o verao estava tirando as tacas de champanha dos caixotes e arrumando-as na grande mesa que instalaramos num canto do celeiro. O champanha seria entregue a tarde, pela firma encarregada de banquetes que Fabian contratara. Os dois quadros do nosso living estavam tambem pendurados, com os 'vendidos' que Fabian colocara.

– Para quebrar o gelo – explicara ele. – Ninguem gosta de ser o primeiro a comprar. Cada negocio tem os seus truques, meu caro.

– Nao sei o que seria de mim sem voce – falei.

– Nem eu – replicou ele. – Escute, estive pensando numa coisa.

Pelo tom de voz, vi que ele tinha tido uma nova ideia.

– O que e agora? – perguntei.

– Estamos cobrando precos baratos demais – respondeu ele.

– Pensei que ja tinhamos resolvido isso. – Passaramos dias discutindo os precos. Tinhamos combinado que os quadros maiores seriam vendidas a mil e quinhentos dolares e os menores a oitocentos e mil dolares.

– Sei que ja falamos nisso, mas acho que fomos demasiado modestos. As pessoas vao pensar que nao confiamos no valor do homem.

– O que voce sugere?

– Dois mil para os quadros maiores. De mil e duzentos a mil e quinhentos para os menores. Assim vao querer ver que somos serios.

– Vamos acabar sendo proprietarios de trinta Angelo Quinn – disse eu.

– Confie no meu instinto, meu caro – disse Fabian. – Esta noite, vamos colocar o nosso amigo no mapa.

– Ainda bem que ele nao vai estar aqui – falei. – Iria desmaiar.

– Pois acho uma pena que ele nao possa vir. Pagando-lhe um corte de cabelo e um bom barbeiro, ele ficaria bem simpatico. As amantes da arte adorariam! – Fabian oferecera-se para pagar a viagem de Quinn de Roma aos Estados Unidos, para que ele pudesse comparecer ao vernissage, mas o pintor respondera que ainda nao tinha acabado de retratar a America. – Entao – disse Fabian -, fixamos em dois mil?

– Voce e quem sabe – respondi. – Vou me esconder no banheiro, quando alguem perguntar o preco de um quadro.

– E preciso ser ousado, meu caro – disse Fabian. – Estamos com sorte. Ontem a noite fui a uma festa e conheci o critico de arte do Times. Esta passando o fim de semana aqui e prometeu vir hoje.

Fiquei apreensivo. Quinn so conseguira duas linhas num jornal italiano, quando da sua exposicao em Roma. Tinham falado bem dele, mas em apenas duas linhas.

– Espero que voce saiba o que esta fazendo – disse eu.

– O homem vai ficar deslumbrado – assegurou Fabian. – Olhe so em volta. Este celeiro esta que e uma maravilha.

Eu tinha olhado tanto e por tanto tempo para os quadros, que eles ja nao me provocavam nenhuma reacao. Se fosse possivel, eu teria ido ate a ponta extrema da ilha e ficado a olhar para o oceano Atlantico ate que tudo aquilo terminasse.

Ouviu-se um som de vidro partido atras de nos e a moca exclamou:

– Pronto!

Virei-me e vi que ela havia deixado cair uma das tacas de champanha. Talvez fosse boa aluna, mas nao devia ter muita pratica em lidar com tacas de champanha.

– Nao se preocupe, querida – disse Fabian, ajudando-a a recolher os cacos. – E um bom augurio. Ainda bem que voce deixou cair a taca, lembrou-me de que temos uma garrafa na geladeira.

A moca sorriu, grata, para Fabian. Nas tres semanas em que estava trabalhando para nos, ele a conquistara completamente. Quando eu falava com ela, parecia que estava falando atraves de uma grossa parede.

Fabian entrou na divisao em que tinhamos instalado um escritorio e voltou com a garrafa de champanha. Tinha insistido em comprar uma geladeira para a galeria.

– O dinheiro da compra sera reembolsado logo na primeira semana – dissera.

Fiquei vendo-o desenrolar habilmente o arame.

– Miles – falei -, acabei de tomar cafe.

– E que tem isso, meu velho? – A rolha pulou. – Este e um grande dia. Temos de aproveita-lo ao maximo. – A vida dele, segundo eu descobrira, estava cheia de grandes dias.

Serviu champanha para mim e para a moca. Depois, ergueu a sua taca.

– A saude de Angelo Quinn! – brindou. – E a nossa.

Bebemos. Pensei em todo o champanha que bebera desde que conhecera Miles Fabian, e abanei a cabeca.

– Oh, por falar nisso, Douglas – disse ele, voltando a encher sua taca. – Quase ia me esquecendo. Outro dos nossos investimentos vai estar representado aqui, esta noite,

– Qual deles?

– Na festa, ontem a noite, havia uma convidada de honra. – Riu, bem-humorado. – Priscilla Dean.

– Oh, meu Deus! – exclamei. Boa parte da grita contra nosso filme fora dirigida a estrela principal. Sua foto, nua e nas posicoes mais provocantes, aparecera em duas das maiores revistas sexy do pais. Multidoes seguiam-na pela rua. Fora vaiada por uma parte da plateia, ao aparecer num programa de televisao. Aumentara a bilheteria do filme, mas eu tinha medo de que prejudicasse a reputacao de Quinn. – Nao me diga – falei – que voce a convidou para o vernissage.

– Claro que sim – disse Fabian, calmamente. – Vamos sair todos nos jornais. Nao se preocupe, Alma Gentil. Chamei-a de lado e disse-lhe que a… nossa ligacao com ela teria que permanecer secreta. Ela jurou pela saude da mae dela. Dora – disse ele para a estudante -, espero que voce entenda que tudo o que for dito aqui dentro nao e para ser repetido la fora.

– Claro, Sr. Fabian – retrucou a moca, espantada. – So o que nao entendo e… quem e Priscilla Dean?

– Uma mulher a-toa – respondeu Fabian. – Gosto de ver que voce nao le revistas imorais nem assiste a filmes improprios.

Terminamos a garrafa de champanha sem fazer mais brindes.

Henry ja estava a minha espera, quando cheguei ao restaurante, pouco depois do meio-dia. Nao estava so. Sentado junto dele estava uma moca muito bonita, com longos cabelos castanhos. Quando me aproximei da mesa, ele levantou-se e apertou-me calorosamente a mao. Nao estava usando oculos, seus dentes estavam brilhantes e certos, tinha um ar bronzeado e saudavel e engordara um pouco. Tingira o cabelo e podia passar por um homem de trinta anos.

– Doug – disse ele -, quero lhe apresentar minha noiva. Madeleine, este e meu irmao.

Apertei a mao da moca, engolindo uma porcao de perguntas.

– Hank me falou tanto em voce! – disse Madeleine, numa voz grave e agradavel.

Sentei-me diante deles. Reparei que nao havia bebidas na mesa.

– Madeleine nunca veio aqui – explicou Henry -, e achou que gostaria de conhecer.

– Queria conhecer voce – disse ela, olhando bem para mim. Tinha olhos grandes e cinzentos, que eu imaginei que pudessem ficar azuis conforme a luz. Nao parecia uma mulher noiva de um homem que tinha fama de impotente.

– Isto pede um drinque. Garcom… – chamei.

– Para nos, nao, obrigado – disse Henry. – Deixei de beber. – Seu tom de voz era levemente desafiante, como se estivesse a espera de que eu fizesse comentarios. Mas nao fiz.

– E eu nunca fui de beber – disse Madeleine.

– Nesse caso, nada de drinques – disse eu ao garcom.

– Posso pedir? – perguntou Henry. – Acho que temos pouco tempo.

Madeleine levantou-se e nos tambem.

– Nao vou almocar com voces – disse ela. – Sei que tem muita coisa a falar. Vou dar uma volta, para conhecer esta cidadezinha, e depois tomo um cafe com voces.

– Nao va se perder – disse Henry.

– Nao ha perigo – falou ela, rindo.

A expressao de Henry, ao ve-la caminhar para a porta, era de admiracao. Madeleine tinha pernas longas, silhueta esbelta e um andar ao mesmo tempo elegante e sensual. Henry parecia ter-se esquecido de respirar.

– Meu Deus! – exclamei, assim que ela saiu. – Que historia e esta?

– Ela nao e o maximo? – perguntou ele, sentando-se.

– E uma garota encantadora – disse eu, com conviccao. – Vamos, conte-me tudo.

– Vou me divorciar.

– Acho que ja nao era sem tempo.

– Tambem acho.

– Onde estao seus oculos? – perguntei.

– Agora, uso somente lentes de contato – explicou com um sorriso. – Aquele seu amigo, Fabian, mandou-me a um otimo oculista. De-lhe um abraco, quando estiver com ele.

– Voce pode faze-lo pessoalmente. Acabo de deixa-lo.

– Gostaria, mas tenho de voltar a Nova York as quatro horas.

– O que voce estava fazendo em Nova York esta manha? – Nunca me tinha passado pela cabeca que meu irmao poderia sair de Scranton.

– Moro la – respondeu Henry. – Madeleine tem um apartamento em Nova York e a firma mudou para Orangeburg, a meia hora, mais ou menos, da cidade.

O garcom voltou com dois copos de agua. Henry mandou vir coquetel de camarao e um bife. Seu apetite, como sua aparencia, melhorara.

– Agradeco-lhe ter vindo ate aqui para me ver, Hank – falei. – Mas por que a pressa? Por que tinha de ser hoje?

– Os advogados querem fechar o negocio esta tarde – explicou ele. – Ha tres meses que estamos trabalhando nele e finalmente temos tudo pronto, de modo que eles nao querem dar tempo ao

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